Lula chega aos 100 dias de governo sem base consolidada nem marca petista no Congresso
Novas políticas públicas e relançamento de programas sociais, que marcaram primeiros três meses, não precisaram passar por análise dos parlamentares. O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), chega aos 100 dias de governo sem uma base aliada consolidada nem uma marca petista aprovada no Congresso Nacional.
Nesses três meses e meio de governo, Lula adotou novas políticas públicas e relançou programas sociais — alguns de forma turbinada — como o Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida e o Mais Médicos, por exemplo.Contudo, nenhuma das iniciativas passou ainda por votação no Congresso. Portanto, não houve a análise de texto que dependesse ou mostrasse a força da base aliada do presidente. O teste está por vir nos próximos meses.
A primeira prova de fogo diz respeito à aprovação de Medidas Provisórias (MPs) editadas por Lula, que inclusive formalizam e embasam grande parte das iniciativas adotadas pela administração federal, como os próprios programas citados acima.
O governo se vê em meio a um conflito em torno do modelo de tramitação das MPs entre as cúpulas da Câmara dos Deputados e do Senado, e busca salvar seus textos antes que percam o efeito a partir de junho.
As MPs têm força de lei assim que publicadas no Diário Oficial da União, mas precisam ser aprovadas em até 120 dias pelo Congresso para que não tenham a validade encerrada.Sem conseguir resolver o impasse, o governo até conseguiu um acordo para a análise dos conteúdos de 12 das 13 primeiras MPs de Lula. No entanto, parte será transformada em projetos de lei de urgência e emergência ou incorporada a outros textos em tramitação.
O caminho será mais longo e dependente de uma base aliada no Parlamento para que as MPs sejam aprovadas com o mínimo de mudanças.
A expectativa do governo é que as primeiras comissões mistas para as MPs comecem a funcionar nesta semana. A previsão inicial era que a instalação fosse em 4 de abril, mas foi adiada por risco de falta de quórum perto do feriado de Páscoa e últimos ajustes na negociação do governo com a cúpula do Congresso.
O retorno das comissões mistas na tramitação de MPs pode ajudar a gestão de Lula no sentido de equilibrar a análise dos textos entre Câmara e Senado – onde há um ambiente mais pró-governo –, já que os colegiados são formados por 12 deputados e 12 senadores. Ou seja, com o mesmo peso entre ambas as Casas Legislativas.
Cenário da base de apoio na Câmara e no Senado
Líderes governistas avaliam que contam com uma maioria dentre os 81 senadores que dê até para tocar Propostas de Emenda à Constituição (PECs) na Casa, a depender do tema, embora ainda prefiram não arriscar.
As PECs precisam do apoio de ao menos três quintos tanto da Câmara quando do Senado: 308 deputados e 49 senadores.
Na Câmara, porém, a situação é mais volátil e nebulosa. Os 464 dentre os 513 deputados federais que reelegeram Arthur Lira (PP-AL) à presidência da Câmara, com o apoio do governo, não são a base aliada de Lula na Casa.Atualmente, a base de apoio a Lula é formada pelos partidos PT, PCdoB, PV, MDB, PSD, PDT, PSB, Psol, Rede, Avante e Solidariedade. Somados, são cerca de 220 deputados.
O União Brasil, partido formado a partir da fusão do Democratas com o PSL (pelo qual Jair Bolsonaro foi eleito em 2018), figura como a maior incógnita de votação até o momento. Apesar de ter três ministérios, a legenda se diz independente e abriga vários parlamentares com histórico de anos de antipetismo.
Além disso, o governo ainda aposta em atrair deputados tidos como independentes e até mesmo de siglas de oposição que não são tão fieis ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), principal antagonista a Lula na política nacional.
O Republicanos, por exemplo, é uma das siglas que se coloca como independente e que está na lista de prioridades das tentativas de aproximação do governo.
Com 42 deputados, o partido recentemente formou um bloco parlamentar com o PSD e MDB — que apoiam o governo Lula –, fato que deu esperanças ao governo de conseguir mais votos da legenda.
O governo tem tido mais dificuldade de entrar nas bancadas do agronegócio, da segurança pública e evangélica. Há diálogo com parlamentares desses grupos, porém, a maioria deles não está alinhada com a gestão petista.
Até aqui, o Planalto tem apostado nas moedas de troca mais tradicionais da política brasileira para atrair os congressistas: distribuição de emendas do Orçamento e cargos, principalmente no segundo e no terceiro escalão da administração pública federal.
Diferentemente do governo Bolsonaro, o presidente Lula defendeu que mais políticos ocupassem cargos de destaque na Esplanada dos Ministérios. MDB, PSD e União Brasil foram as principais siglas de centro e de direita que indicaram ministros.
O governo ainda busca tirar tanto poder sobre as emendas das mãos dos presidentes da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). A ideia é que o Planalto tenha maior controle sobre o tempo e destino da distribuição delas aos parlamentares.
Nos bastidores, ala de deputados reclama que recursos não foram distribuídos como acham que deveriam já ter sido. A previsão é que os parlamentares sejam mais contemplados às vésperas de votações importantes no Congresso para o governo, como no caso de MPs e da reforma tributária.